Uma das coisas mais importantes que Victor & Leo conquistaram em sua carreira com certeza foi o respeito da classe. Difícil encontrar algum artista sertanejo que tenha alguma coisa negativa a dizer sobre o talento dos dois. Pode-se dizer que rola até um certo ciuminho de boa parte desses artistas por conta do prestígio conquistado por Victor & Leo. Afinal eles se tornaram queridinhos da Globo, queridinhos dos artistas veteranos, que vivem puxando o saco deles mesmo eles não dando tanta bola assim para esse tipo de coisa.
Esse respeito conquistado se deve ao caráter inovador do trabalho deles. O tipo de som que eles fazem é diferente de tudo o que já foi feito na música sertaneja, mesmo percebendo-se nesse som influências claras de outros subsegmentos sertanejos, principalmente o sertanejo “cult” de Renato Teixeira e Almir Sater. Por conta disso e desde que se consagraram, sempre se espera deles algo num nível acima dos outros.
Nunca foram adeptos da normalidade, do descartável, do trivial. Mas entre não ser adepto da normalidade, do descartável, do trivial, e se adequar a uma necessidade mercadológica, entra provavelmente a imposição da gravadora, que faz com que a balança penda para o lado da segunda opção.Essa coisa ter que gravar obrigatoriamente um disco por ano nem sempre é positiva. Aliás, nem sei pra quê isso. Algumas bandas internacionais passam anos sem lançar nada e continuam sendo idolatradas pelos fãs.
No caso do Victor & Leo, a gravação de um disco por ano vem acompanhada da alternância entre CDs de estúdio e DVDs. Só pra vocês saberem, todo e qualquer produtor musical prefere gravar disco de estúdio. Não conheço um que prefira o contrário. Alguns dos principais chegam a cobrar o dobro do valor que cobram por um CD de estúdio para gravarem um DVD só por conta das inúmeras dores de cabeça que um trabalho desse tipo envolve. Num disco de estúdio, a liberdade de criação é com certeza bem maior. E foi num disco de estúdio que Victor & Leo consagraram a própria genialidade. Por conta disso, é inevitável a comparação do disco “Boa Sorte pra você” com o “Borboletas”. É inevitável pensar no “Boa Sorte Pra Você” como sendo o “Borboletas II”.
O “Borboletas” era o primeiro disco de estúdio na fase pós-estouro da dupla Victor & Leo. Naquele momento, eles ainda tinham algo a provar. E provaram, sim, o que todo mundo já reconhece hoje em dia: que eles são excelentes no que fazem. Dois anos depois daquele álbum, não há mais a necessidade de provar alguma coisa. Nem de consolidar a carreira. Ela já está consolidada. Victor & Leo são uma das pouquíssimas duplas da nova geração (estranho chamar de “nova geração” uma dupla com quase 20 anos de estrada) que pode lançar qualquer coisa que mesmo assim vende bem e entra em uma ou duas trilhas de novela.
Mas essa desnecessidade de se provar algo não é, sempre, positiva. Produzir um disco sem aquele bichinho sussurrando no ouvido frases do tipo “esse disco tem que consolidar sua carreira” pode ser algo meio traiçoeiro. No caso do “Boa Sorte pra você”, percebe-se pouca preocupação na elaboração de arranjos ainda mais interessantes ou até de músicas mais profundas do que as que haviam no “Borboletas”. Fora que o repertório também é bastante curto. São 11 faixas, sendo que uma delas é apenas uma versão (desnecessária, aliás) de outra do mesmo disco, num ritmo diferente. Das 10 que restaram, 2 são regravações de outros artistas, o que é de se estranhar em se tratando de Victor & Leo na fase pós-estouro, e 2 são releituras de antigas canções da dupla. Sobraram apenas 6 músicas realmente inéditas.
Há, também, uma sutil mudança em algumas características do trabalho daquele disco para este, provavelmente acentuadas por conta da participação (que creio ter sido mais de análise e de aprovação do que de efetivamente de colocação da mão na massa) do produtor consagrado Guto Graça Melo. O acordeon, por exemplo, não traz mais aquele timbre característico que praticamente só se ouvia nas músicas da dupla Victor & Leo. Isso porque o sanfoneiro que acompanhou a dupla por anos e anos (Luciano Passos) se desligou recentemente da banda. O acordeon continua bem gravado e ainda é inserido no mesmo estilo de canção que era inserido na época do outro acordeonista, mas o timbre é mais normal e padrão do que o que marcava os outros trabalhos da dupla.
A inserção do teclado nos trabalhos da dupla, que aliás já tinha sido feita no “Ao Vivo e em cores”, desta vez deu-se de forma diferente. Abandonou-se o excesso na utilização do hammond, que tinha sido uma das características mais marcantes do último DVD e que deixava o trabalho com cara de rock oitentista, e priorizou-se mais o piano e o órgão, o que aproxima o trabalho ainda mais da normalidade inerente aos outros trabalhos sertanejos. Até o timbre do violão do Victor está mais “normal” do que em outras ocasiões. Talvez pela simplicidade maior nos arranjos do que no disco “Borboletas”, o fato é que o violão não está tão evidente quanto antes.
Essa aproximação do trabalho deles ao trabalho dos outros artistas pode ser percebida também na duração das faixas do disco. Uma aparente preocupação em deixar as faixas sempre numa média de 3 minutos de duração cada uma. Isso é bom em rádio, em shows, mas pode ser arriscado no sentido de não explorar a música em todo o seu potencial. No disco “Borboletas” percebia-se um incrível e intenso trabalho de elaboração de arranjos. Veja o da canção título daquele disco, por exemplo. Um arranjo divido em duas partes, e um no meio já numa outra pegada e também sem tanta preocupação com o tempo de duração. No “Boa Sorte pra você”, o que se ouve em boa parte do disco são arranjos que, para não ficarem tão curtos, são repetidos antes que a música possa começar efetivamente a ser cantada.
O bom é que eu estou apontando vários detalhes que provavelmente vão fazer com que a maioria dos leitores deste texto pensem que darei uma nota ruim, que não gostei do disco, que bla bla bla. Nada disso, o disco é bom, sim, mas afastou-se um pouco do peculiar e enebriante estilo Victor & Leo. É um disco mais preocupado com o mercado e com não desagradar quem quer que seja com a inserção de idéias maravilhosas mas arriscadas. Faltou mais do “Borboletas” no “Boa Sorte pra você”, mas para uma dupla que está acostumada a trabalhar num padrão altíssimo de qualidade, isso não quer dizer tanta coisa assim.
Nota: 9,0
Fonte: Blognejo
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